sábado, 30 de março de 2013

Como o Brasil pode ser o maior exportador de soja do mundo diante da precariedade do seu transporte



Maior exportador de soja mundial: este é o patamar a que o Brasil deverá chegar se ultrapassar a produção de soja dos EUA, o atual líder neste setor. Em termos de produtividade tal fato não está longe de se concretizar, mas se analisarmos a infraestrutura dos sistemas de transporte, responsáveis por transportar os produtos brasileiros às nações compradoras, o Brasil ainda pode permanecer um bom tempo sonhando em ser o líder de exportações de soja.

Isso se deve a um cenário que vem se deteriorando gradativamente: a precariedade de ferrovias, hidrovias e portos para escoamento e exportação de produtos. Em março muitos veículos midiáticos ressaltaram a defasagem no processo de transporte dos itens a serem exportados. Somente nos primeiros meses de 2013, por exemplo, 4,5 milhões de toneladas de milhos a mais foram despachadas para exportação, o que significa cerca de 15.400 viagens extras de caminhões. Com o aumento da demanda, trajetos percorridos em quatro dias acrescidos em dois a seis dias.

O fato de estarmos em tempo de colheita e ainda marcado pela supersafra brasileira de grãos seria um excelente estímulo para alavancar ainda mais as exportações – principalmente num período em que nações poderosas têm suas economias comprometidas pelos tentáculos da recessão econômica, que continua a assombrá-las, e veem no Brasil uma ótima opção para importação a bons custos – mas o entrave existente no trajeto da exportação brasileira causa grande reversão neste cenário positivista.

Com a reduzida quantidade de ferrovias e hidrovias funcionando adequadamente, a maior parte dos produtos chega aos portos por meio das rodovias. Todavia, o trajeto e as condições das estradas não é de modo algum facilitador para o andamento da comercialização do agronegócio brasileiro, já que temos um crescimento quase que explosivo de um único setor de transportes, com o foco no modo rodoviário, que acaba se tornando supersaturado e acarretando em um imenso tráfego de caminhões. Sendo assim, no período da colheita, o número de carretas se torna muito superior à capacidade dos portos de embarcar toda a produção trazida, contribuindo para um verdadeiro caos logístico no setor.

Para agravar ainda mais a situação, com a ausência de silos – estruturas destinadas ao armazenamento de parte da produção – a safra precisa ser escoada imediatamente após a sua colheita, tarefa que se torna quase uma missão impossível diante da precariedade do transporte nacional. Todos estes fatores contribuem não somente para o acréscimo de custos, como também para a perda de parte da produção, que estraga entre a demora de trajeto e a espera prolongada.

Não é de hoje que a infraestrutura logística brasileira clama por reformas e investimentos que promovam a adequada melhoria aos diversos setores nacionais como o portuário, rodoviário e hidroviário os quais, desde a década de 80, se encontram em carência progressiva de fomentos necessários para suas expansões e qualificações. Tanto a gestão FHC quanto a gestão Lula se mostraram incapacitadas para lidar com a precariedade dos transportes e o problema foi apenas se expandindo de modo a atingir patamares extremamente prejudiciais para a situação brasileira, tanto interna quanto externamente.

A estatização também não se mostrou eficiente no aumento de investimentos: o excesso de aparatos burocráticos imposto pelo governo sobre quaisquer medidas a serem adotadas para promover melhorias na infraestrutura é verdadeiro obstáculo para que estradas, ferrovias e portos tenham suas condições melhoradas.

No que concerne às privatizações ou aos PPPs – Parcerias Públicos Privadas – destaca-se a volúpia da iniciativa privada pelo lucro a qualquer preço, não importando a qualidade do produto ou do serviço prestado, sem contar a corrupção brasileira que se tornou algo maligno perpetrado no sistema produtivo brasileiro – seja privado ou público – prejudicando-o em diversas áreas em razão dos vícios na fiscalização dos serviços, inúmeros desvios de dinheiro e superfaturamento de contratos.

Portanto, o clima é caótico por enquanto: rodovias esburacadas, pequena quantidade de trens de carga em circulação e um péssimo controle da movimentação da embarcação e desembarcação nos portos – medidas como a adoção de um sistema de agendamento para o desembarque de caminhões deveriam ser adotadas em áreas de grande movimentação, como Santos, por exemplo. Paranaguá já adotou tal sistema e as filas de carretas para despacho foram reduzidas a metade neste ano. Mesmo assim, tal medida careceria de locais, como pátios e estações de transbordo, para que os caminhões aguardassem a hora agendada, o que requer investimentos.

Todavia, depois de 10 anos no poder, o governo petista parece ter se conscientizado da carência do setor de transportes em termos infraestruturais. No ano passado a presidente Dilma anunciou uma série de medidas referentes à privatização de serviços feitos nos setores ferroviário e rodoviário. Tal atitude realmente parece ser a mais favorável, tanto para os investimentos neste setor, quanto para outros. Vivemos um momento em que os conceitos de privatização e estatização não podem ser pensados de modo completamente distintos, já que tanto um quanto outro são imprescindíveis para manter as engrenagens do desenvolvimento brasileiro em pleno funcionamento, devendo trabalhar de forma complementar um ao outro.

Outra medida adotada pela presidente Dilma foi a criação de uma nova lei que incentivará a construção de portos totalmente privatizados. Atualmente é permitido que apenas sejam concedidos ao setor privado os terminais portuários, enquanto que a administração e a propriedade destes são responsabilidades do governo – algo que pode dificultar o andamento deste setor em razão da já citada burocracia estatal. Em relação às concessões aos investimentos privados, por exemplo, o governo resiste em aceitar a rentabilidade mínima exigida pelos empreiteiros para executar os projetos, como citado em parágrafos anteriores.

Contudo, mesmo os esforços concentrados na gestão Dilma Roussef e os planos implementados pelo Ministério dos Transportes se mostram insuficientes para suprir as necessidades do setor, a expectativa gerada em razão de tais medidas adotadas pela presidente parece se abrandar cada vez mais, já que a concretização delas anda a passos de tartaruga e, mesmo que agilizadas, não resolveriam os problemas a curto prazo, mormente neste cenário de crescimento e demandas aceleradas, o que é um fator preocupante às pretensões comerciais brasileiras.

O país já sente na pele as consequências desta carência em investimentos. Em março de 2013, por exemplo, o grupo chinês Sunrise – que faz negociações comerciais com o Brasil – anunciou o cancelamento da compra de 2 milhões de toneladas de soja brasileira, em razão do atraso nos embarques ocasionado pelo congestionamento dos portos. Isso não é nada perto do que estará por vir se soluções não forem adotadas.

Enfim, implantar regras importantes para alavancar o crescimento econômico é essencial, todavia, mais relevante ainda é concretizar tais medidas. E o aumento de investimentos adequados na infraestrutura do transporte brasileiro é algo que já ultrapassou o prazo para ser realizado.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

terça-feira, 12 de março de 2013

Vai-se Hugo Chávez, fica-se um rombo na economia venezuelana



Depois de 14 anos no poder, o povo venezuelano deu adeus ao seu presidente Hugo Chávez, no último dia 5. Após passar pela quarta cirurgia em Cuba, como parte do tratamento de um câncer que ele desenvolveu há dois anos, Chávez não resistiu a algumas complicações respiratórias e faleceu aos 58 anos de idade.

Com a morte do presidente, seu vice Nicolás Maduro assumiu o posto presidencial e permanecerá no cargo até a convocação das novas eleições presidenciais, que deverão ocorrer em 30 dias. Tanto o governo de Chávez – que lidera e certamente tem a maior probabilidade de continuar no poder – quanto a oposição enfrentarão um verdadeiro abismo econômico, que foi se formando gradativamente e ganhou imenso formato nos últimos anos.

Marcada pela predominância do regime socialista, a Venezuela vem tentando se equilibrar numa corrente econômica desgastada, regida por governos ditatoriais e gestões ultrapassadas, que estacionaram nos tempos de Guerra Fria, sendo altamente exploradas pelo regime capitalista e neoliberal, isoladas do mundo globalizado.

Todavia tal cenário não foi páreo para conter o poderio chavista e sua longa permanência no poder. Basta analisarmos o contexto histórico para entendermos melhor o motivo do desencadeamento deste fator.

Caracterizada como uma economia predominantemente agrícola até o período da Primeira Guerra Mundial, a Venezuela sofreu uma transição econômica que passou a se centrar na extração e exploração petrolífera. Tal atividade passou a ser responsável por 80% das exportações e mais da metade do financiamento da máquina pública. Com a recessão de 1999, o preço internacional do petróleo sofreu uma grande alta, o que contribuiu para alavancar ainda mais a economia venezuelana. Sendo assim, neste ano, quando Chávez foi eleito, a Venezuela era a menina dos olhos para o mercado petrolífero mundial num cenário econômico sustentado pela exportação petrolífera, cuja riqueza gerada era muito mal distribuída e se concentrava nas mãos de uma reduzida elite existente e com a predominância de uma massa paupérrima.

O governo Chávez tinha como plataforma política a conversão de parte dos lucros do petróleo em avanços sociais e optou por reduzir investimentos petrolíferos, direcionando parte do lucro gerado para financiar programas sociais, subsidiando as principais necessidades da massa venezuelana – constituída majoritariamente pelas classes sociais desfavoráveis – conquistando-a cada vez mais e – reduzindo a remessa de divisas para o exterior – contrariando os interesses financeiros o os lucros cada vez maiores das petrolíferas estrangeiras.

Como consequência, com o alimento de cada dia garantido, essa grande massa foi aumentando seu apreço pelo líder venezuelano, o que lhe rendeu dividendos eleitorais, fortalecendo sua permanência no poder, à medida que a oposição se enfraquecia gradativamente.

Tendo maioria absoluta na Câmara, para alcançar seus objetivos e vencer a estrutura de poder das petrolíferas instaladas no país, Chávez optou por uma estratégia de força: desde sua entrada no poder, o ex-presidente populista fechou inúmeras empresas privadas, sem falar no controle imposto sobre toda a imprensa, que teve diversos veículos fechados por publicarem notícias desfavoráveis ao governo chavista – a preocupação em promover uma imagem positivista do país, mesmo que totalmente distorcida da realidade, era o principal foco do ex-presidente em busca de sua eternização no poder.

Todavia, havia uma pressão fortíssima dos países industrializados para a desvalorização da moeda, visando à queda nos preços do “ouro negro”, fazendo com que, no início de 2002, o presidente empossado Pedro Carmona – empresário do petróleo oriundo da Fedecâmaras (Federação das Indústrias da Venezuela) –, por meio de um golpe de estado financiado pelos EUA, que culminou na prisão do presidente eleito Hugo Chávez, alterasse a taxa de juros fixa por um sistema de câmbio flutuante. Tal medida contribuiu para desvalorizar sobremaneira o bolívar, a moeda nacional da Venezuela, e agravar a situação financeira, o que prejudicou a geração de lucros da nação chavista e, consequentemente, a arrecadação proveniente da exportação do petróleo sofreu temporariamente uma considerável redução, mas que favoreceu aos detentores deste monopólio.

Em uma nação cuja economia é praticamente controlada pelo intervencionismo estatal – a diminuição da principal geração de lucro da Venezuela reduziu a produtividade e provocou aumentos inflacionários que se revelaram misteriosos, já que Chávez sempre ocultou os verdadeiros valores das taxas inflacionárias e crescimento do PIB.

Sendo assim, mesmo com a produtividade em baixa e uma necessidade de maiores recursos financeiros para se investir no país, reinvestido do poder após uma revolta da população defronte ao Palácio Miraflores contra o golpe de estado estadunidense, Chávez optou pela redução dos preços no setor de serviços, incluindo o valor do combustível, para não mexer no bolso da população. Resultado: os preços não se elevaram, mas também não houve muitas opções disponíveis de produtos já que, com a redução produtiva e de recursos para importação, formaram-se tremendos buracos nas prateleiras dos mercados, devido à falta de produtos, agravando mais ainda o abismo econômico venezuelano.

Um questionamento que certamente assola a mente de muitos é o porquê, mesmo com toda sua tirania e intervencionismo, Chávez partiu deixando incontável número de venezuelanos que praticamente o idolatravam. A resposta é simples: para uma nação de oposição tão enfraquecida como a Venezuela, em que praticamente a única opção de voto era Hugo Chávez, que soube influenciar e persuadir a mente populacional, não foi nada difícil conquistar tantas pessoas.

Além disso, o ex-presidente ficou conhecido por promover uma certa reversão da situação de acentuada exploração da Venezuela cometida pelos países desenvolvidos como Inglaterra e EUA – que estabeleceram seus poderes hegemônicos sobre diversas nações desfavorecidas e geradoras de petróleo, marcadas por extrema miséria, submetendo os exploradores a situações praticamente escravagistas para gerar pequenos lucros a uma pequena elite dirigente em troca da importação petrolífera.

Ao entrar no poder venezuelano, o movimento chavista foi mudando um pouco, de forma gradativa, essa situação no país ao obrigar as petrolíferas a reverterem 3% da arrecadação em petróleo para ações sociais, reduzindo a desigualdade social, mas ainda sem conseguir reverter o estado de pobreza.

Sem contar que o ex-presidente sempre optou por ajudar a população ao seu modo: oferecer as condições necessárias à maioria esmagadora da população, composta por pessoas menos favorecidas, de modo a não fomentar o crescimento da classe média e alta por meio de investimentos em educação, por exemplo. O motivo: ter o mínimo de sujeitos pensantes e opinativos possíveis, pois quanto mais informados, maior o perigo que representariam ao governo chavista. O sucessor de Chávez que se cuide agora para combater tantos problemas.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas